PARTE 08
AMOR REBELDE
Enquanto isso, outra vertente dessa história se movimentava há muitos quilômetros de onde estávamos. Após o rapto da princesa os cinco rebeldes integrantes do GAEL (Grupo de Aventureiros de Elite dos Lâminas) haviam utilizado de magias para alcançar mais rapidamente o esconderijo próximo à cidade de Thenarallann, local famoso por ultimamente estar sendo erguida uma estátua de lava rubi do Imperador Sckhar em sua forma de dragão em tamanho real, que é aproximadamente o mesmo que o da lendária estátua de Valkaria, a Deusa da Humanidade, localizada há muitos reinos dali com o tamanho aproximado de meio quilômetro.
Após a viagem por teleportes e alguma caminhada, haviam finalmente chegado ao esconderijo, aonde ficariam até o dia em que deveriam executar a última parte do plano para atentar contra o poder tirano do Rei Dragão: matar a princesa.
O bando possuía uma base secreta nas profundezas de um bosque a poucos minutos da cidade de Thenarallann, em uma pequena e abandonada cabana de madeira que há muito deveria ter pertencido a fazendeiros. Era um casebre esquecido em meio ao matagal, só o grupo a conhecia, pois a trilha que para ali levava sumira há anos. Folhagens, cipós, trepadeiras e musgos surgiam por todos os cantos no lado de fora do casebre, camuflando-o na mata. Apesar de tudo, o grupo como utilizava aquela base há alguns meses, apenas consertara-a por dentro para evitar que os estragos e apodrecimentos da madeira pudessem fazer o casebre desabar sobre eles.
Havia poucos cômodos, a varanda, com um chão que rangia (assim como as portas), tinha uma cadeira de balanço da época que encontraram no local; a sala de estar, uma lareira, sofás roubados e uma mesa de centro construída pelo grupo; havia uma cozinha com um fogão de tijolos e uma grande mesa; dois quartos ficavam no andar inferior, e tinha a casinha jardineira do lado de fora da casa.
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No momento a princesa encontrava-se cativa com eles. Todos os véus cobertos para impedir que a vissem durante a parada em Logus foram retirados pelos rebeldes, o que fez com que todos os homens ali ficassem boquiabertos. Niathallas era uma belíssima mulher. Ainda trajada com suas vestes delicadas da corte, tecidas por elfos experientes, suas curvas eram bem modeladas e reveladas, mas ao mesmo tempo o pano escondia suas partes sutilmente dando um ar de sensualidade, que com os entalhes de fios de ouro em desenhos perfeitos de folhagens e pássaros, lhe dava um ar nobre, de pureza e de poder que uma princesa geralmente emana. Sua face era lindíssima, fazendo vez ou outra o líder do bando rebelde acabar se pegando em admirá-la e depois enrubescer por causa disso. Cabelos lilás-claro até a nuca, com mechas vermelhas e algumas verdes, olhos desenhados pelos deuses como uma elfa, um semblante de princesa e ainda havia a aura de meio-dragoa que ela parecia emanar. Niathallas apesar de tudo estava assustada e receosa. Desde que fora levada, o máximo que fizeram foram retirar seus véus para não atrapalhar na fuga. Ela não estava presa por cordas, fios ou magia, nem dentro do casebre ela foi presa em um quarto e trancada, e por incrível que pareça, ela estava sentada de frente para a lareira acesa ante ao líder que estava sentado em outra poltrona com uma mulher meio-elfa (revelado pelas orelhas pontudas, mas não grandes) que o massageava os ombros, e ainda tinha o bardo de manto rubro como magma que tocava seu violino vermelho e escondia a face sob um chapelão de abas exageradamente longas, sentado na janela, tocando uma leve música e observando a paisagem do bosque fora do casebre. Ela sabia plenamente que fugir seria a maior idiotice, afinal, o bardo demonstrara possuir magias de rastreio, a meio elfa era uma arqueira acostumada a perseguir “presas” e ainda tinham um ladino que estava em algum outro local da cabana com o quinto membro, um minotauro imenso que trazia nas costas seu martelo de guerra mágico. Ela não estava presa, mas também não podia fugir.
- Acalme-sse, princessa... – disse o bardo tocando uma nota do violino ao vê-la angustiada – Não há pelo que ssse preocupar! Não ainda! Relaxe... – então olhou o líder por sob a aba do chapelão – Roan, acho que deviamosss nosss apressentar!
- Para que deveríamos? Ela é a presa! – disse o líder que evitava olhar nos olhos da princesa a qualquer custo. E ela ao olhá-lo achava estranho, mas ele era o homem mais belo que já havia visto na vida, um garoto jovem, de longos cabelos ruivos como chamas, olhos vermelho-sangue, face sem qualquer imperfeição e mesmo usando uma túnica verde rotineira de aldeão, parecia um herói em armadura de batalha pela aura de poder que exalava – Já sei que você tem essa mania de ficar fazendo apresentações, mas vai lá! Só não vai matar ela de susto por que ainda temos nossa missão a completar, e ela deverá estar viva!
Assim que disse isso, se levantou do sofá e seguiu para seu quarto, com a meio-elfa indo atrás dele jogando um olhar hostil sobre a princesa.
- SSSSh! Princcessa, ligue para ele não! Sssei que não ssou exxatamente sseu tipo! Mass um cavalheiro tem o dever de ssse apresssentar a uma dama! – disse o bardo se levantando e puxando o chapelão – Meu nome é SSzzés, também chamado de…
Quando retirou o chapéu, a princesa abafou o grito de horror.
- …A Brasssa Chiante!
Niathallas agora realmente estava assustada, o bardo misterioso em trajes rubro magma e voz chiante era na verdade um homem-serpente, uma das raças mais perigosas e temidas em Arton, por terem sido criados por Sszzaas, o Deus Serpente da Traição que foi banido do Panteão após um estratagema que quase exterminou todos os Deuses. SSzzés era uma espécie de homem de pele esverdeada, cabeça careca, olhos sem cílios e sobrancelha, com pupila em fenda e suas mãos reptlineas. E por mais estranho que fosse, aquela aberração maligna sorria amigavelmente e andou até ela se ajoelhando em reverencia. A Princesa nem sabia como reagir.
- Perdão, sssenhorita, não desssejava amedrontá-la! Sssei que sssou feio que nem rabo de urubu quando foge, mas não sssou tão maligno quanto pensssa! Na verdade nenhum de nósss aqui o é!
- E-então... – a princesa se arriscou – vocês não vão me matar?
O bardo homem-serpente sentou-se onde estava Roan há poucos segundos. Ela temeu encarar seus olhos ofídios, mas logo começou a sentir uma intimidade em olhá-lo diretamente, como um amigo, algo que se arrependeu quando a resposta veio em sorriso:
- Não, infelizzzmente sssua morte é necccessssária!
A princesa engoliu em seco e fechou os olhos, por segundos desejou do fundo de sua alma viver. Ela, pela primeira vez, temeu a morte. Lágrimas escorregaram sutis pela sua face. Seu pai, o rei… Sua mãe, que nunca conhecera… Sua vida mesquinha na corte… tudo acabaria, e por causa de um casamento forçado, que por mais blasfêmia que fosse, ela se recusava a aceitar… Ao fechar os olhos pela dor em seu coração ela viu a escuridão da morte envolvendo-a, mas um toque de um pano quente em seu semblante, secando suas lagrimas a acordou do abismo de terror. À sua frente, a aberração ofídia a consolava com um lençinho. Ela sentiu repulsa da criatura assassina e ao mesmo tempo certo reconforto.
- Não chore, sssenhorita! Sssei que é duro… Masss é pelo bem da nação! Pelo bem de todosss!
- Mas por… por que isso? Pelo m-meu bem também? – ela disse soluçando em lágrimas.
- Eu preferiria morrer do que me casssar com um lagarto gigante cussspidor de fogo! – o homem-serpente retrucou em tom de brincadeira – E olha que para ssser lagarto para mim falta pouco! SSSSSh!
A princesa até viu graça, mas seu coração espremia em sangue de tanta dor.
- POR QUE VOCÊS MATAM AS PESSOAS???? SÓ POR QUE ACHAM QUE RESOLVERÃO ALGO ASSIM???? – ela se exaltou clamando pela própria vida – DOU-LHES DINHEIRO, TÍTULO, TERRAS!!!! MEU PAI LHES OFERECERÁ TUDO!!!! MAS NÃO ME MATE!!!!!
O líder do bando espiou pela frecha da porta. Sszzés sentou-se ao lado dela, abraçou-a e lhe acariciou as mechas.
- Sssenhorita, você não tem nada a nosss oferecer que possssa acalmar o que sssentimos! É a vingança! Cada um desssse grupo perdeu algo pior que a própria vida, muitosss aqui sssão como mortosss-vivosss! Sendo que o poder necromantico que ainda nos faz andar é a vingança! Perder sssua vida é um privilégio que todosss aqui dessejamos mais que tudo, mass não podemosss! Poisss ssabemosss que Ssckhar repete a cada insstante a maquina de destruir futuross!
A princesa olhou profundamente nos olhos sérios do homem serpente e viu algo.
- O-o que você perdeu que lhe faria desejar morrer?
O Homem-serpente cerrou os olhos em dor, a lembrança era dolorosa demais.
- Algo por que valessse viver! – disse como se contorcendo em dor – Ssenhorita, Não teríamoss algo pelo que viver sse não tivésssemoss algo por que valesssse morrer! E eu perdi a única coissa que me fazia sssentir valor em viver! Minha amada foi levada pelo tirano! Não sssou um homem-ssserpente qualquer, minha cara… Sszzés, o bardo Brasssa Chiante, não serve a nenhum deuss! Eu resspeito meu pai criador Sszzaas, mas não tenho motivoss para trair ninguém! Eu vivo pela mússica!
A princesa não acreditava naquilo, estava receosa, pois sabia da natureza traidora dos servos de Sszzaas, mas ao olhar nas profundezas de seus olhos de serpente, viu uma fagulha de sinceridade.
- Nasci no reino longínquo de Ahlen, um antro de trapaceiross, assssassssinos e todo tipo de pior de sorte de gente, e apessar de tudo, eu era tratado, ainda, como um monstro peloss aldeõess e como um ssemi-deus peloss criminossoss, todoss me temiam! Eu sempre gosstei da cultura elfica, humana e anã, uma dass coissass que maiss me encantava era a arte! Queria me dedicar a ela dessde que era um filhote, mass ass pesssoass que enssinavam, temiam ssequer chegar perto de mim! Um dia, não vendo maiss ssaída, me aliei a bandoleiross! E em minha juventude meu poder natural como homem ssserpente era tamanho que qualquer vila pequena era ssaqueada por mim e meuss parceiross em pouquísssimo tempo!
“Em um dessses ssaques, encontrei uma esscola de artess aonde roubei algunss livross! Apóss algum tempo já ssabia tocar insstrumentos de corda e fazzer essculturas de barro, pedra e madeira! Com isso abandonei os bandoleiros e ingresssei na carreira artíssstica, mas quem iria querer ouvir uma mússica cantada por um homem-ssserpente belíssssimo como eu que parece uma lagartixa sem perna que os deusssess masstigaram, acharam mole demais e cussspiram no mundo, não é? Então me travessti de humano, ussando dessde sempre esses trajess vermelhoss que vê agora, inclusssive meu chapéu! As pesssoass gosstavam de minhas músicas, mas as poucas vezes que eu revelava minha aparência no final dosss ssshowsss, elas mudavam de opinião!”
“Masss havia um lugar que eu poderia ser aceito! Como monsstro que era, fui até o extremo nordesste de Arton, nas Montanhass Sssanguináriasss e ingresssei no coro ssagrado de um templo a Megalokk, Deus dos Monstros! E lá conheci a minha verdadeira razão de viver, algo pelo que valia morrer! E quando nosso culto dessceu para Sssckhashantallasss, ele acabou sssendo desscoberto pelas forçass de Sckhar e o Tirano retirou-me minha amada!”
“Dessde aquele dia eu vivia querendo morrer! Mass tinha ideaisss que me impediam! O primeiro era minha busssca divina de atravéss da músssica provar que há coisas realmente belass dentro das esscamass de um homem-ssserpente, e a sssegunda seria um dia reencontrar minha amada Sssylphie! Você é muito nova e pouco ssabe de amor verdadeiro, e pode apostar que é doloroso... – parou para respirar fundo e evitar deixar-se levar pela emoção - … Sssaber que a única pessoa que você ama verdadeiramente esstá ou morta e esquecida na memória das pessoas ou ssservindo a seu maior inimigo em seu harém pessoal! E por issso… VOU VINGÁ-LA!”
Cada vez que se exaltava mais sua pele começava se tornar escamas e seu corpo metamorfoseava, até que quando chegou ao ápice da fúria perdeu o controle e se transformou em um torso humanóide imenso de escamas, face de serpente e da cintura para baixo, uma grande cauda de cobra. A transformação fez sua roupa rasgar completamente e bater sua cabeça no teto deixando cair alguma poeira e abalar a estrutura. Ao ver a besteira, magicamente voltou à forma humana e a roupa rubra surgiu nele como se saísse de sua própria pele.
- Perdão… me exxxcedi!
Roan saiu do quarto, irrompendo pela porta ao ver aquilo pela frecha.
- Sszzés!!! Quer derrubar a cabana?
- Desssculpa, Roan! Me exxxcedi!
A princesa já não via mais a monstruosidade naquela criatura.
- O senhor tem mesmo uma história difícil! Mas então é por isso que fazem essas coisas horríveis?
- Sssim! Em prol daqueless que morrem ou ssofrem nas mãoss do Dragão Tirano! – apontou ao líder de cabelos ruivos – Roan foi aquele que encontrou cada um de nós e noss sssalvou da perdição! Ele nos mostrou um caminho longe do abissmo da depresssão!
- Hum… quando conheci essa cara-de-anaconda não era mais que uma lombriga que estava jogada em um canto qualquer tocando um violão velho e pedindo dinheiro em uma cidade do interior! – disse Roan sempre sério e enrubescendo ao olhar a princesa.
Nesse momento a porta que levava a varanda foi aberta e entrou um halfling de bochechas gordas, pança avantajada, meia idade, cabelos negros bagunçados e um cavanhaque espetado, que usava uma camisa quadriculada. Junto entrou (tendo que se abaixar), o enorme minotauro que agora estava de peito nu com apenas a tira de couro que prendia seu martelo de guerra mágico, feito de lava rubi, em suas costas. O minotauro trajava um saiote, estava cheio de cicatrizes no peito e tinha brincos em argolas nos dois chifres, além de uma na narina. Ele aparentava ser extremamente forte e medonho, mas no momento o que dava maior temor é que devia ter se exercitado e fedia a suor de boi.
- ARRGGHH!!! – disse Roan – Ptolomeu, pelo amor dos Deuses! Vai tomar um banho!
- Como desejar, jovem líder! – disse o minotauro com sua voz gutural e forte como seus músculos, antes de sair para seguir até o lago mais próximo.
A princesa ficou assustada com aquilo. Pelo que os clérigos de Tanna-toh, que lhe foram professores na corte, haviam falado os minotauros eram para serem seres que prezam a força e a escravidão dos mais fracos, sendo que esse, pelo contrario, parecia submisso ao humano Roan, líder dos rebeldes.
- Asssusstada, sssenhorita? – disse o homem-serpente bardo tocando uma leve música com seu violino – Esssa montanha de mússculosss posssui tantoss motivoss para ssservir essse humano… - disse jogando um olhar para Roan -… quanto cada um de nósss!
O halfling chegou da cozinha com uma bandeja de madeira e pôs uma xícara velha e fissurada para cada um, depois serviu um pouco de chá.
- Todos fomos retirados da miséria por Roan, e por isso somos fiéis a ele! – disse enquanto servia e colocava um saco de biscoitos caseiros sobre a mesa de centro – Meu nome é Tchintchuin Tchuntchay, sei que meu nome foi um erro durante um ar de falta inspiração de meus pais, por isso me chame de Tchun, apenas!
A princesa se sentia mais confortável entre eles, mesmo que se sentisse como uma zebra criando amizade com um bando de leões famintos loucos para matá-la a qualquer momento.
- E o senhor por que segue esse caminho?
- Resumindo… - disse pegando um biscoito e comendo enquanto se servia de chá - Eu vivia no Reino de minha raça, na capital, a Colina dos Bons Halflings, mas sempre quis saber como era o mundo! Abandonei minha família, me tornei aventureiro com minhas habilidades ladinas, e quando pisei fora do meu reino tudo deu errado! Fui capturado pelo reino de Portsmouth, entregue como escravo em um acordo de paz entre Sckhar com o reino, servi nas minas de lava rubi por anos, e por fim, quando pensei que ia morrer asfixiado naquele antro de torturas, os Lâminas realizaram um golpe terrorista, libertando todos nós que ficávamos nas minas, eu, especialmente, fui libertado por Sszzés, Roan e Seléstia!
- Quem é Seléstia? – a princesa curiosa bebeu um pouco do chá.
A resposta veio detrás da porta que foi escancarada e de onde saiu a meio-elfa com rosto carrancudo.
- Eu sou Seléstia! Seléstia Narfengard! E não pergunte minha história, não interessa a uma princesa mimada como você! – e assim foi abraçar Roan.
- E o minotauro? – indagou a princesa.
- Ah, o Ptolomeu Bärghan? Ele é um nobre de Tapissta que ouviu falar sssobre o poder de Sssckhar e sua crueldade, aí viajjjou da outra ponta do Reinado ssó para enfrentá-lo em bussca de provar ssua força! Foi um doss últimoss a entrar no bando e ssó sserve aoss Lâminass por que ssssimpatizzzou com Roan! – disse Sszzés com sua voz chiante.
- Nossa!
- Ele é de grande ajuda! –comentou Roan que cruzou o olhar com a princesa, logo os dois ficaram rubros e desviaram o olhar. Sszzés riu da cena e Seléstia ficou vermelha de raiva.
- E quem era aquele ajjjudante esspadachim que lhe ajudou daquela vezz, sssenhorita?
- Espadachim? – ela tentou lembrar por alguns segundos – Não lembro de nenhum…
- O que Sszzés quebrou o sabre usando o chicote de fogo… - Tchun deu a dica.
Ela parou e pensou por breve momento.
- Ah, sei! Não sei quem era! Ou era um herói que meu pai havia contratado ou algum espadachim sem noção que estava pelas redondezas!
- Ele disse algo sobre ser um dos maiores do Reinado! – cuspiu Roan – Idiota! Todo desajeitado! Tombou do Besour quando perdeu a arma! Acho que era um tal de Antonywillians… ou algo parecido!
- Mas nada que causasse algum problema ao meu grande Roan! – disse Selétia tentando beijar a nuca do líder que apenas se afastou evitando-a.
– Agora chega de conversar com a prisioneira! Caso se esqueceram, a qualquer instante estaremos matando-a! – Roan disse carrancudo.
As suas palavras atingiram a todos como um soco. Roan adentrou seu quarto deixando Seléstia do lado de fora. Sszzés que possuía os sentidos mais apurados para o som, percebeu que do outro lado Roan ofegava em uma dor intocável, por isso riu, ajeitou seu grande chapéu e saiu para o jardim tocando seu violino.
- Todos vamos descansar! Tivemos uma longa jornada até aqui! – disse Tchun recolhendo as xícaras – E o resto dos biscoitos são meus!
O bando de rebeldes havia caído no sono. A princesa foi presa em um quarto sozinha com o minotauro Ptolomeu Bärghan (ele havia voltado do banho) que a vigiava até desabar no ronco também. Niathallas fingia dormir, mas estava acordada prontamente. Continuaram em deixá-la desamarrada, acreditando que o minotauro seria suficiente para cuidar dela, mas foram negligentes, ela esperou-o dormir e começar a roncar alto para iniciar seu plano de fuga.
O local em que estava era o antigo porão da cabana. Havia uma cama improvisada com palhas para ela, e tinha muitos barris de despensa espalhados. Niathallas se levantou e caminhou até o minotauro. Ele não parecia que iria acordar tão cedo, pois seu alto ronco chegava a fazer a madeira estalar. Seguiu tateando o chão atrás da escada que levava ao térreo, subiu degrau por degrau furtivamente para evitar qualquer ranger que a denunciasse e empurrou o alçapão onde estava presa. Ao abri-lo, se viu sob a escada que levava aos pisos superiores na época que os aposentos do 2º andar eram usados (o bando temia subir e o chão ceder). Assim que saiu, fechou o alçapão e caminhou pela sala em direção a porta. Ela começou a sentir a liberdade próxima, cada passo parecia uma infinidade, segurou a maçaneta, suava frio, fechou os olhos e virou… trancada. Olhou para os sofás. Em um dormia Tchun aos roncos e no outro Seléstia que trazia a seu lado um arco e uma flecha para qualquer imprevisto. A princesa seguiu até a janela, temeu pular pois era uma das partes que mais rangia e seu vestido atrapalharia.
A porta de um quarto abriu abruptamente. Roan estava acordado e encontrou a princesa acuada a procura de fuga. O coração dos dois dispararam assim que os olhares se cruzaram. A princesa pensou que ia desmaiar, pois poderia ser morta ali mesmo. Roan avançou sobre ela com semblante sério. Pegou-a pela cintura e tapou-lhe a boca para evitar deixar que ela gritasse. A princesa deixou tudo passar por sua mente, inclusive que podia ser estuprada naquele momento e ali. Roan colocou a mão no cinto, puxou-o, roçou na espada embainhada e puxou algo. Ela fechou os olhos pensando que uma lâmina fosse atravessar seu ventre.
- Direi a eles que você me furtou enquanto eu dormia! Agora vá!
Ela abriu os olhos quando ele destampou sua boca, e viu uma chave em sua outra mão. Niathallas olhou profundamente nos olhos de Roan confusa e estranhamente encantada.
- Por que voc…? – ela tentou indagar.
- Apenas vá! – ele ordenou ficando com as bochechas tão rubras quando seu cabelo, e então a ignorou e voltou a seu quarto.
Meio sem ação, recobrou a consciência quando sentiu o chão ranger pelos roncos do minotauro Ptolomeu no subsolo. Destrancou a porta e saiu. Tomou cuidado com a varanda de madeira e quando pisou na grama chegou a perder o equilíbrio, era como uma ave que encontrava a liberdade após escapar do matadouro. Ela deixou uma lágrima furtiva correr por seu rosto. Se sentia uma idiota, pois havia algo dentro daquela cabana que finalmente encontrara após anos e era algo pelo que valesse morrer, mas criou forças e correu até a floresta, correu pela vida, ainda que aos prantos. Antes de sumir entre os troncos, deu uma última olhada para trás, e as lágrimas jorraram quando olhou para porta e viu, em pé, parado e como ela, sob lágrimas, o menino de cabelos ruivos e olhos vermelho sangue que aqueles assassinos chamavam de líder. Seu coração partiu-se ao meio causando uma dor inexplicável, ela desviou o olhar e correu cegamente pela mata.
Roan via tudo da porta, chegou a sentir um soco no estomago quando seus olhares se encontraram antes dela sumir entre as folhagens. Quando ocorreu tal fato a simples idéia de ela nunca mais retornar foi suficiente para aflorar em seu corpo uma emoção que jamais se preocupara em sentir. Sem explicação, tentou segui-la, era como se quisesse vê-la mais uma vez, mesmo que fosse a última. Correu para fora da varanda, mas ela já havia sumido. Cambaleou até uma árvore próxima, bateu com a cabeça no tronco e começou a contorcer o rosto em lágrimas.
Sentia-se um idiota, ele traíra os Lâminas, seria punido por isso e não alcançaria seu objetivo… tudo sem qualquer explicação, simplesmente deixara fugir o grande trunfo do bando. Se odiava por fazer cada parceiro seu sofrer futuras punições por perder a princesa prometida… se odiava mais ainda por ser fraco e por algum motivo achar que não seria capaz de matá-la então era melhor libertá-la… mas se odiava de verdade por que apesar disso tudo, não se arrependia de nada, conquanto ela estivesse bem… Ele apenas sabia se odiar naquele momento.
- Já ouviu falar da lenda do amor entre o guerreiro Lassstimusss Dragonfang e da princcesssa Lady Arthellesss, sssenhor Roan? – a voz atingiu Roan como uma flechada de fogo. Sszzés assistira tudo de cima a árvore na qual o líder batia a cabeça no momento – Dizem que Niathallas é a reencarnação da princesa prometida… Mas fico me perguntando… quem ssseria a reencarnação de ssseu amor, não é líder Roan, ou melhor dizendo… Lassstimuss? SSSShhh!!!!
Sszzés desceu do galho em um pulo sem olhar o rosto em pânico e pasmo de Roan.
- Não ssse preocupe, líder Lassstimusss! Não hei de contar a ninguém! A esscolha é sssua!
- D-deixe de ser ridículo, Sszzés, meu nome é Roan, não acredito em reencarnação! Só não pude deixá-la morrer!
- Eu não dissse nada, líder! Eu ssou apenasss o bardo, você é o líder! Quem dá as ordensss! SSShh!!!
E assim o homem-serpente seguiu para o casebre aonde iria descansar na cadeira de balanço. Roan correu até seu quarto e se trancou. Sszzés só ria daquilo tudo, como os humanos eram idiotas…
Quando o sol de Azgher sumia no horizonte e a lua cheia prateada de Tenebra já era vista no ponto oposto com seu manto negro de trevas e estrelas cintilantes, um brado extremamente alto vindo do porão tremeu o casebre derrubando uma coluna que fez parte do segundo andar desabar sobre a jardineira e Tchun cair do sofá.
- A PRINCESA FUGIU!!!!!! – Bradou Ptolomeu Bärghan acordando todos no casebre de sobresalto.
O clima era de tensão na sala de estar do casebre antigo. O que restara da luz do sol entrava serenamente pelas janelas rangedoras, cada um do grupo estava mais cabisbaixo que o outro, Roan era o que estava pior, caído no sofá com as mãos sobre o rosto como em desespero, em contra partida, Sszzés era o único que sorria enquanto tocava uma musica de lamurias pela janela. Aquele grupo era, há alguns anos, considerado Grupo Especial de Elite dos Lâminas, nenhuma missão nunca falhara e todas foram de grande sucesso, a fuga da presa era algo inadmissível. Todos olhavam Roan com pena, tantos anos trabalhando duro para criar sua fama de Rebelde número um na guilda, e acabou nessa desgraça. “Tolos”, pensou Sszzés, “Não entendem nada! Sssshhh!!!”.
- Pelos chifres de Tauron! – disse Ptolomeu – Temos que ir buscá-la! Eu vou já que deixei a garota escapar! Devia ter sido mais forte e ficado acordado! Devo recuperar minha honra!
Roan permanecia calado… queria gritar, mas não podia… Sszzés ria.
- Você faz mais escândalo que um estouro da boiada… - disse Tchun – iria só sinalizar o caminho que ela não deveria correr!
- Sem contar que ela deve estar bem longe daqui! – Seléstia, a meio elfa, resmungou.
- Sssshhh!!! Vocês já ouviram a hissstória de Lassstimus e a princessa prometida Arthellesss? – Sszzés indagou como se quissesse mudar de assunto.
- Fica quieto lagartixa sem braço! – Tchun bradou – Ninguém quer ouvir historinhas aqui não!
- Eu deixei a princesa fugir! – disse Roan deixando todos brancos pela repentina afirmação.
- Não, querido! Não se culpe… - disse Seléstia – Sszzés vê se faz algo e tenta localizar aquela maldita!
Sszzés sorriu e fez uma mesura respeitosa à dama. Seu cavalheirismo parecia sarcástico naquela situação.
- Como desssejar, sssenhorita! – todos fizeram silêncio e Sszzés tocou um fio do violino que vibrou sonoramente. De olhos fechados a magia bárdica expandiu-se e aumentou a freqüência da vibração. Sentiu tudo na região em um raio de 70 metros: árvores, animais, galhos secos, flores, riachos, formigas, vento, a princesa… Sszzés sorriu, era como já imaginava – Está há algumas dezenas de metros daqui! Deve ter parado para descansar, ou… Para repensar a idéia!
Roan arregalou os olhos, essa frase fora para ele, perturbando-o mais ainda.
- Ótimo! – disse Seléstia pegando seu alforje e seu arco longo – Vamos, Tchun, sou boa em rastreio, mas você é perito na área mais que eu! Você acha e eu atiro a flecha na presa!
- Claro! – respondeu o halfling que deu um pulo do sofá não querendo perder tempo. Vestiu seu traje negro que cobria seu rosto até o nariz e apanhou seu cinturão com ferramentas de ladrão.
- Mas não a machuquem! – Roan irrompeu levantando-se da cadeira, ação que surpreendeu e confundiu todos. Sszzés apenas sorria com seus dentes ofídios. Roan tentou uma explicação – Devemos deixá-la intacta até o dia do aniquilamento!
- Sssério, Lassstimusss? Errr... Roan? – Szzés ainda ria.
- Certo, vou evitar matá-la! – disse Selétia com frieza, beijou a bochecha do líder e partiu com o halfling.
Roan enterrou o rosto nas palmas de sua mão. Queria se matar… queria poder revelar seus sentimentos… mas a primeira opção era a mais cabível. Sszzés apenas sorria.
Seléstia estava furiosa. Ela caminhava pisando fundo na grama enquanto Tchun se preocupava de apenas seguir as marcas de pegadas na grama fresca que a princesa amassou quando passou por ali. Achou estranho o fato de as pegadas darem muitas voltas pelo mesmo lugar, ir para longe e depois retornar. Parecia até que a princesa estava na duvida entre fugir ou retornar ao cativeiro.
- As pegadas a partir daqui estão frescas! – avisou após um tempo.
A meio elfa nem deu atenção. Filha meio elfa de um nobre de Nova Ghondriann com uma elfa fugitiva de Lenórienn, Seléstia há muito se cansou das intrigas da corte e resolveu sair em aventuras e em uma de suas viagens acabara parando neste reino. Teve a vida salva em Sckharshantallas por Roan quando clérigos de Sckhar, em uma cidade do interior, tentaram capturá-la para oferecê-la como oferenda a seu Deus, e hoje o serve fielmente como arqueira profissional. Desde que fora salva acabou se apaixonando pelo guerreiro de olhos rubros, mas nunca se pegou em uma situação como a desse dia. Roan estava muito estranho com a tal “princesinha”, era como se estivesse mexendo com os sentimentos dele… talvez fosse ciúmes fúteis… mas talvez o amor fosse verd… Chutou uma pedra nesse momento e quando bateu em algo atrás de um arbusto veio um:
- Ai!
- ACHAMOS! – Tchun bradou.
A princesa levantou de súbito detrás do arbusto aonde há pouco estava derramando lágrimas dolorosas sem entender o porquê. Mas não tinha tempo para chorar, os inimigos a acharam. Seléstia, como exima arqueira, puxou uma flecha e a disparou em segundos cortando parte do cabelo lilás-claro da princesa.
Desesperada, Niathallas apenas correu. Ela corria por sua vida, e isso a fazia parecer uma presa de uma caça para Seléstia que sorriu como se estivesse revivendo seus tempos em que caçava em seu reino natal, Nova Ghondriann. Disparou algumas flechas, mas a princesa era sortuda demais e escapava sempre. Tchun atirou algumas adagas, mas só acertava as árvores. A princesa aproveitou quando os perseguidores haviam perdido sua cola, para procurar um arbusto e jogar uma pedra nele. Ao ver o arbusto se mover Seléstia disparou nele, percebeu que era uma distração e viu a princesa correndo por entre os troncos já longe. A meio elfa sorriu, pegou a flecha, colocou no arco, apontou, mirou e disparou. Acertou a presa…
A princesa bateu contra uma árvore quando sentiu o projétil em seu ombro direito. Mas ela era forte, era uma meio dragoa apesar de tudo, aquilo nem doera. Puxou a flecha e continuou correndo. Seléstia disparou três flechas ao mesmo tempo. Uma acertou uma árvore, as outras duas perfuraram o corpo do alvo. Niathallas tombou.
A arqueira e o ladino se aproximaram do corpo.
- Nem diga para eu carregar, tem nem graça! – disse Tchun que tinha o tamanho de uma criança de 5 anos.
- Eu carrego esse cervo! A caça é minha! – Seléstia sorriu aproximando-se da princesa desacordada.
De súbito tudo aconteceu muito rápido. Niathallas abriu os olhos surpreendendo a arqueira, mordeu seu calcanhar derrubando-a, se levantou, chutou Tchun como uma bola, e saiu correndo para o meio da floresta que já estava bem escura, pois o sol havia ido embora quase completamente.
Assim que Tchun conseguiu se levantar, ainda que tonto, pegou uma pedra mágica em seu cinturão que brilhava magicamente à noite. Iluminou a meio-elfa e passou uma erva no seu calcanhar que adormeceu a parte dolorida dela.
- Maldita! Vamos caçá-la! – Seléstia rugiu como um predador sedento por sangue.
- Não! Melhor retornarmos ao casebre! Ela tem dentes fortes de meio dragão, poderia ter arrebentado seu calcanhar! Você não poderá andar tanto! E a noite se aproxima fazendo-nos correr o risco de nos perder e as chances de reencontrá-la são ínfimas!
A arqueira teve de acatar a sugestão.
Assim que chegaram ao casebre, Roan estava em pé olhando a paisagem pela janela e Ptolomeu estava branco como se tivesse visto o próprio Leenn, Deus da Morte. Sszzés estava normal com seu violino sentado no sofá e sorrindo.
- O que houve agora? – Tchun indagou.
- O líder deixou a princesa fugir! – disse Ptolomeu com sua voz poderosa que tremeu o casebre.
- Ptolomeu!!! – Seléstia repreendeu-o e abraçou o líder – Não jogue a culpa no líder se você foi incopet… - o dedo de Roan calou-a, mas não mais que as palavras dele.
- Fui que a deixei escapar! Eu que a dei a chave!
Seléstia e Tchun ficaram pálidos assim como Ptolomeu já estava. Roan olhou a lua tentando imaginar onde ela estaria naquele momento. Sszzés tocou uma nota cortando o silêncio.
- C-como assim? – Seléstia estava confusa e indignada – M-mas por quê?
- Não sei… - Roan respondeu olhando a lua cheia que subia no céu.
Seléstia indignou-se com a resposta negligente do líder e explodiu em raiva.
- COMO ASSIM “NÃO SABE?????” Você arremessa nossa fama pela janela por causa de uma princesinha mesquinha dessa? - então ela ponderou sobre as palavras e o resultado foi mais ódio misturado a ciúmes – ROAN VOCÊ ENLOUQUECEU????
Assim ela caiu no sofá aos prantos, o ciúme a consumia por dentro, a frustração amorosa rompia seu coração. Ela largou toda sua vida de luxo para seguir com a única pessoa que ela amava, que por acaso não a correspondia… ela sabia disso, mas nunca recebera uma prova.
Roan ficou vermelho. Estava com raiva das palavras da meio-elfa que apenas confundiam mais suas emoções.
- O que você está insinuando, Seléstia????
Ptolomeu Barghän ergueu-se de súbito, seus músculos e tamanho intimidaram todos, até por que era raro ficar sério. Ao se levantar acabou batendo com os chifres no teto sem querer, desabando poeira sobre a sala. Sua voz poderosa ressonou pelo aposento como um trovão.
- Chega, vocês dois! Sejam fortes! Nosso grupo deve prezar pela coletividade, ou nos tornaremos fracos!
Um breve silêncio, cada um ali, por mais exaltado que estivesse, temia responder ao minotauro e receber uma represália pior. Sszzés sorria de tudo e para todos.
- Que seja! Vou sair para pegar um ar! Não quero me meter em confusão com ninguém! – Roan respondeu finalmente, entrou em seu quarto e disparou pela porta pisando fundo.
Seléstia tentou dizer mais algo, porém interrompeu-se ante o olhar intimidador de Ptolomeu Barghän.
Após sair do casebre, Roan cambaleava pelo bosque fazendo algo que não fazia desde os 6 anos de idade… ele liberava lágrimas por mais vontade que tivesse de contê-las. Ele não se entendia, o agente mais glamuroso dos Lâminas deixo-se levar por sentimentos desconhecidos e perdeu sua maior chance de ser reconhecido em todo império. Trombava com árvores, tropeçava em raízes, galhos e espinhos cortavam sua roupa e corpo, ele encontrava-se perdido na floresta do desespero e do caos, que sua própria mente criava.
Após alguns minutos resolveu parar e refrescar a mente em um pequeno riacho próximo. Era um fluxo de água não muito grande, que vinha de uma cachoeira ao longe, e atravessar o rio era fácil, apesar das pedras escorregadias, cada leito ficava uns 5 metros de distancia um do outro, e alguns peixes de água doce passavam por ali, contra a corrente, para seguir até a nascente aonde desovariam. Roan despiu-se completamente, pegando apenas a bainha com sua espada que ficava presa por um cinturão que atravessava seu peito. Caminhou nu até o leito do rio e observou as águas que corriam para o leste. Ele observava cada detalhe e ouvia o som. Os animais da floresta estavam silenciosos, com exceção de algumas corujas e cigarras, as quais adoravam o calor daquele reino quente. As folhagens balançavam ao vento realizando uma sinfonia de sons com o fluxo da água, Roan sorriu, apesar de tudo, parecia que o riacho estava levando seus pensamentos negativos embora. Seguiu pela margem até uma área um pouco mais funda e com pedras menos escorregadias e entrou. A água naquele reino era estranha, de manha era fria em dias normais, mas a noite esquentava, Sszzés contara que seria sobre uma tal de transferência de calor por convecção, seja lá o que isso queira dizer.
Cansado de pensar demais afundou o corpo inteiro no riacho ficando apenas com a cabeça do lado de fora. Relaxado, suspirou e reparou que nos céus uma lua cheia resplandecia majestosa cercada por um manto de estrelas, e sua luz emanava sobre o riacho deixando suas águas com tom prateado. “Até parece magia!”, pensou enquanto pegava um sabão que trouxera e banhava-se. Passado um breve tempo, ouviu um som próximo, alguém parecia ter mergulhado perto dali. Instintivamente desembainhou sua espada, ainda mergulhado. Mas acalmou-se quando viu um cervo saindo assustado da água na margem oposta com seu movimento, teria provavelmente tentado apenas atravessar o riacho. Voltou a relaxar, mas novamente ouviu o som, e não conseguia ver quem era, parecia ter mergulhado completamente na água. Pressentindo que não fosse mais um animal silvestre, foi de espada em punho, sem se preocupar de vestir sequer sua cintura para baixo, em direção aonde as ondas na superfície revelavam que alguém mergulhara. De súbito seu coração pulou quando viu que ali no fundo era uma espécie de humanóide, talvez elfo, talvez humano, não sabia reconhecer, foi furtivo, cuidadoso para não fazer barulho. Sua tensão era tão grande, que nem sentia o frio da brisa da noite em seu corpo nu. Esperaria emergir e então golpearia com a lâmina de sua espada.
A pessoa mergulhada seguiu na direção contraria dele, sem percebê-lo e emergiu… mas ele não conseguia mover nada, paralisou-se, apenas uma parte dele manifestou-se, uma a qual não possuía controle. Ali, há menos de 2 metros estava ninguém menos que a princesa Niathallas, também completamente despida, banhando-se nas águas prateadas do riacho, abençoada com a luz da lua que brilhava cintilante em sua pele branca, levemente bronzeada e macia. Os cabelos lilases molhados chegavam a ser tão sensuais como de uma ninfa, mas a manifestação de seu corpo foi em especial com a nudez em que a princesa também se encontrava. Ela parecia mágica, uma fada, talvez ninfa, talvez avatar de uma Deusa da Beleza… não sabia explicar. Sua confusão e pesares sumiram, só conseguia admirar aquele corpo perfeito, foi então que lembrou que estava nu e totalmente aparente a ela, no impulso tentou voltar. Pisou na pedra, escorregou e caiu com tudo na água molhando-a.
- AAAAAAAAHHHHHHHHH!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! – assustada com o voyer, ela gritou e tentou correr para a margem, porém escorregou também em uma pedra e caiu dentro d’água com tudo por pouco não batendo a cabeça em uma pedra afiada, pois antes Roan havia corrido atrás dela e pego em seus braços salvando-a.
Ainda deitada em seus braços, observou o desnudo guerreiro. Os olhos rubros dele passavam um sensual mistério, seus cabelos molhados da cor da lava cintilavam em tom mais prateados à luz da lua cheia, e seu corpo era atraente, como o de um verdadeiro guerreiro. A princesa o temia, mas sentia algo diferente cada vez que olhava nos olhos dele, algo que a inflamava por dentro e não a permitia fugir dos braços do bravo guerreiro, mesmo que fosse o carrasco que iria sacrificá-la em prol de demonstração de rebeldia. O líder dos aventureiros de elite da organização rebelde estava estupefato com aquela linda princesa, ela era o ser mais belo de todos que já vira, talvez por ser meio-dragoa... talvez, mas não sabia como poderia ser tão perfeita, sabia que era seu carrasco, mas sabia também que sentia algo a mais que isso…
Os corpos pelados tocavam-se excitantemente, os dois sentiam o calor um do outro, os seios dela a mostra o excitava mais ainda, e ela sentia algo na cintura dele que lhe provocava o mesmo… os dois sentiam o amor de cada um… os dois abraçavam cada um… os corações disparavam retumbantes em uma orquestra que faria de invejar os maiores bardos de Arton, o calor era tamanho que nem a água ou o vento tinha influência sobre eles... fecharam os olhos e como que por um magnetismo entre os corpos, o rosto de cada um se aproximava romântica e vagarosamente, ela tocou seu rosto com as delicadas mãos de princesa trazendo o guerreiro até ela, ele explorou o corpo da jovem princesa como um aventureiro… os lábios se aproximaram… a respiração denunciava o desejo… e então…
- OPA! ACHO QUE CHEGAMOS NA HORA ERRADA!!!! HAHAHAHAH! – uma voz masculina veio da margem atrapalhando os dois que deram um pulo, com Roan desembainhando sua espada e servindo de escudo para a princesa.
Na margem estavam quatro homens de armadura vermelha feita com entalhes de lava rubi e usando elmos que possuíam nos lados enfeites em forma de asas de dragão em um mineral vermelho transparente. Dois traziam lanças de aço na mão e os outros dois desembainharam suas espadas.
- Vamos, rapazes! Matem o garoto e vamos levar a menina para nos divertir essa noite! – disse o que parecia o líder do grupo por causa de seu elmo ser no formato do focinho de um dragão vermelho – Esses devem ser os “vultos” que andavam assombrando aquele casebre abandonado na floresta, como nos foi relatado!
Roan, sem nem se incomodar de estar nu, instintivamente saltou sobre um, de arma em punho. Sua lamina foi aparada com o cabo da lança, ele aproveitou isso para apoiar-se na espada e ao invés de cair, dar uma rasteira no guarda antes de cair no chão. Seu pé doeu por causa do impacto na armadura dele, mas derrubou-o. O líder veio com a espada para cima dele, defendeu-se com a própria. O guarda caído se levantou e tentou estocar Roan, que desviou por centímetros e virou a espada nele, mas não acertou, pois o líder o derrubou com uma rasteira e caído, ficou imobilizado quando pisou em suas costas.
- Não tem como mais escapar, não é? – sorrindo o líder da milícia pisou mais fundo nas costelas dele causando uma dor enorme – Por causa de seu desacato verá sua namorada sendo banqueteada por nós quatro! HAHAHAHAH!
Dois guardas desafivelaram as calças e despiram sua parte inferior indo para o riacho agarrá-la. A princesa tentou fugir, mas estava desacostumada à água e às pedras, tentou jogar água para afastá-los, mas nada adiantou, eles agarraram seu braço, lamberam seu pescoço e levaram-na para a margem. Um usou sua força e abriu as pernas dela, enquanto o outro se dirigia a ela para estuprá-la. O lanceiro que imobilizava Roan deu sua lança ao líder que apontou a lança para a cara do garoto pelado.
- E reza para que depois dela não seja você! Hahahahah!
A princesa chorava e se debatia, mas os guardas eram mais fortes e passavam a mão em seu corpo, quando o primeiro tentou macular seu corpo, parou estático, na verdade todos pararam… ela olhou pro lado e viu Roan, ele estava estranho, faíscas saltavam de seus olhos rubros.
-RRRROOOOOOOAAAAAAAAAAARRRRRRRRRRRRRRRRRRRR!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! – ele bradou animaliscamente e ergueu-se com uma força sobrenatural arremessando o líder do bando para trás. Roan não tinha o poder de dragão em seu sangue ou de um demônio, como deve estar pensando… ele tinha a força do amor! A força mais poderosa, pois você não teme matar e, muito menos, morrer por ele!
A súbita fúria pegou os guardas de surpresa que logo pegaram em suas armas.
- LARGUEM-NA!!!!!!! – Roan rugiu pegando sua espada que havia caído de sua mão quando derrubado.
-Somos quatro! Nem ouse! – disse o líder meio hesitante.
Roan não respondeu com palavras, mas ações. Sem temer se ferir ou morrer, fez um movimento vertical com a espada e magicamente ela se imbuiu de chamas crepitantes, o líder dos guardas preparou-se para correr, mas já era tarde, em segundos, Roan estava sobre ele enfiando a espada que atravessou seu corpo e armadura como papel, queimando seus órgãos internos. Para retirar fez um movimento na horizontal fazendo um belo estrago no corpo que estava em chamas. Assustados, os demais guardas ameaçaram atingir, com uma lança, a princesa indefesa no chão, que soluçava em desespero e pranto. Isso apenas aumentou sua fúria, saltou sobre os três sem temer nada, como um berserker faria. A lança desceu sobre o rosto da princesa, mas a pele dela era resistente, apesar de tudo era meio dragão vermelho, e o máximo que causou foi um arranhão leve que mal sangrou. Enfermo, por mais mínimo, fez Roan explodir sua ira.
- Morram! – ergueu a espada flamejante em vertical, os guardas estavam sem ação – Chamas do Vigésimo Dragão do Leste…
Os guardas perceberam que ele ia invocar alguma magia e dispararam desesperados sobre ele.
-… embua-me usando a energia do corpo do homem morto…
Um guarda tentou estocá-lo com a espada, mas foi atrapalhado quando Niathallas derrubou-o segurando seu pé de surpresa.
-… e com seu manto queime os vivos!
Ao terminar, o corpo do líder da milícia crepitou e eclodiu em brasas que magicamente dirigiram-se para a lâmina da espada, a qual liberou um fluxo de chamas que jorrou como um chafariz cobrindo todo seu corpo em brasas que não o queimava, mas que ao chegar ao chão, queimou grama, plantas e atingiu guardas e princesa. Esta estava a salvo, sua linhagem sangüínea com dragões vermelhos lhe permitia resistência praticamente invencível a calor e fogo, já os guardas assavam, e para se vingar, Niathallas ainda surpreendeu Roan agarrando sua mão, puxando sua espada mágica e com um brado de guerra, correu desajeitada com a arma para cima dos guardas que não conseguiram escapar e tiveram a lamina enterrada em suas virilhas.
- Ouch! – instintivamente disse Roan ao ver aquilo.
-Vai… atacar… a sua… mãe! – disse ela em seguida girando a espada desajeitada e cortando o peito dos três que caíram agonizante. Ela devolveu a espada a Roan com um sorriso. O carrasco agora é que temia a princesa.
Roan caiu fadigado no chão, instantaneamente, assim que o manto de fogo apagou do corpo do guerreiro, pegou-o nos braços e arrastou para longe dos corpos carbonizados. Aproximou-se da margem e preocupada molhou seu rosto para que acordasse.
Ainda tonto, abriu os olhos devagar, até que tudo tomou forma e viu o rosto da princesa… pensou que ia desmaiar com tanta beleza, mas ficou vidrado, assim como ela em seus olhos.
- Te am… - ele começou, mas foi interrompido pelos lábios da princesa que pegaram-no desprevenido. Ele entendera finalmente o que sentia, ela também, assim beijaram-se, abraçaram-se, os corações voltaram a debater-se em seus peitos, o amor crescia, o desejo aumentava, logo ele e ela estavam deitados sobre a grama e começaram a se amar como nunca antes. Trocando caricias e satisfazendo seus desejos mais íntimos, carrasco foi o homem e a princesa foi mulher. Sob a luz da lua, amaram-se como nunca alguém havia feito naquele bosque. Amaram-se como homem e mulher.
Deitado em um galho sobre uma arvore na orla do leito do riacho, Sszzés, sob uma magia que criava silencio mágico sobre ele, presenciara e presenciava tudo, mas apenas sorria… Tudo estava andando como mandava o destino…
“Sssssssshhhhhhhhhh!!!!!!!”, riu em pensamentos.
______ Ao ler, por favor comente ______
e o terceiro deus ? não iria sair essa quinta ?
ResponderExcluirAí é com o Arcanios,
ResponderExcluirSou só o romancista da Taverna, e espadachim nas horas vagas rsrs
~ Antonywillians
Aí é com o Arcanios!
ResponderExcluirSou só o romancista da Taverna, e espadachim nas horas vagas rsrs
~ Antonywillians
Obrigado pela resposta, ansioso pelo livro.
ResponderExcluirvenho lendo esse romance e posso afirmar cara vc é um verdadeiro escritor. a sua capacidade de tomar o lugar do personagem e descrever as cenas é impressionante.
ResponderExcluirdigo q pode até c comprar com tolkien
Já saiu o Terceiro Deus para download Zero!
ResponderExcluirE Leo, realmente nosso amigo Antonywillians é muito bom mesmo!